Fazenda Nacional tem proposto aos contribuintes a possibilidade de uso dos precatórios para abatimento de débitos com o governo.
A utilização de precatórios federais em acordos de transação da dívida ativa com a União elevou a demanda de empresas e escritórios de advocacia por esses títulos. O deságio nas operações de cessão desses direitos tem ficado na faixa de 30% a 50%, segundo advogados tributaristas e empresas que participam desse mercado.
A Fazenda Nacional tem proposto aos contribuintes a possibilidade de uso desses direitos para abatimento de débitos com o governo.
Uma das vantagens de utilizar o precatório de terceiros nessas operações é que a empresa pode comprá-lo com deságio e abater a dívida pelo valor de face, o que gera, na prática, um desconto adicional para quitar a dívida com a União.
No ano passado, o Congresso aprovou a proposta do governo federal que alterou a Constituição para criar um teto para o pagamento de precatórios e requisições de pequeno valor (RPVs). Em dezembro de 2021, o estoque federal desses títulos somava R$ 100 bilhões. Atualmente, está em R$ 79 bilhões, segundo dados do Tesouro Nacional.
Antes da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos precatórios federais de qualquer valor eram negociados com deságio próximo de 80%. Após a mudança na Constituição, o desconto para grandes valores chegou a mais de 50%. O próprio governo propôs receber os precatórios com um deságio de 40% para quem não quiser ficar na fila de recebimento, mas esse dispositivo não foi regulamentado.
A emenda constitucional também prevê alternativas para o uso dos precatórios, como quitar débitos parcelados ou inscritos em dívida ativa, comprar imóveis públicos, pagar outorga de concessões ou adquirir participação societária em privatizações. A maioria das opções ainda depende de regulamentação.
O uso desses direitos para amortização de dívida tributária, incluindo juros e multa, já está previsto em lei. A Fazenda Nacional também regulamentou a utilização do precatório na transação tributária, que é a negociação direta com credores inscritos na dívida ativa.
De acordo com a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), admite-se a utilização de precatórios federais, próprios ou de terceiros, para amortizar ou liquidar o saldo devedor nessas negociações.
Antes da emenda, o mercado de precatórios federais era mais restrito, uma vez que todos os títulos emitidos em um ano tinham pagamento garantido no ano seguinte. Portanto, os descontos eram pequenos, afirma o sócio da área tributária do Bichara Advogados, Pedro Siqueira Neto.
A aprovação da PEC dos Precatórios gerou incerteza sobre o prazo de pagamento e elevou o deságio. Principalmente para aqueles de alto valor, que estão no final da fila criada após a promulgação de duas emendas que trataram do tema.
“O mercado está muito mais aquecido, especialmente nas transações tributárias. Hoje, quando você inicia uma transação individual com a Procuradoria, um dos benefícios que ela coloca na conversa é a possibilidade de utilização de precatórios. Com isso, você cria um mercado e cria também demanda”, diz o sócio da área tributária do Bichara Advogados.
Ele afirma que em 80% das transações abre-se a oportunidade para utilizar o precatório, o que depende também do sucesso na negociação para aquisição desses direitos. Há também negociações com objetivo de utilizar precatórios federais para outros tipos de compensação tributária, como amortizar parcelamentos (Refis) em aberto.
“Até a emenda constitucional, não existia mercado de precatório federal, como tinha do municipal e estadual. Você não tinha deságio, porque ele era emitido em um ano e, no ano seguinte, era pago com certeza.”
A advogada especialista em direito tributário, Mírian Lavocat, afirma ter recebido, mas recusado, propostas de aquisição dos precatórios pertencentes ao seu escritório, oriundos de honorários e taxa de sucesso em algumas ações.
Lavocat diz esperar um aquecimento maior do mercado secundário diante da expectativa de regulamentação de outras formas de uso desses títulos. Também destaca a mudança que atrelou a correção desses direitos à taxa básica de juros, atualmente em 13,75% ao ano, o que garante rentabilidade de mais de 8% acima da inflação esperada.
“Não tenho interesse em vender os que eu tenho no escritório, de honorários de sucumbência e negociações com clientes no êxito. Eu vejo o aumento da Selic e vejo a possibilidade de negócio, especialmente para outorgas, aquisições societárias e pagamento de concessões, melhorar ainda mais o meu crédito.”
A expectativa de colocar em prática o pagamento de outorga é outro ponto que tem despertado o interesse das concessionárias, que já começaram a realizar sondagens nesse mercado.
O sócio-diretor da Mercatório, empresa especializada na negociação desses ativos, Daniel Costa, afirma que precatórios federais de maior valor, acima de R$ 10 bilhões, por exemplo, voltaram a ser procurados para compensações tributárias de empresas.
Nesse caso, há preferência por aqueles que acabaram de ser expedidos e que não devem ser pagos antes de 2024, o que garante um desconto maior na aquisição. Precatórios de menor valor e expectativa de pagamento mais rápido são demandados, principalmente, por fundos de investimento.
“Nos últimos quatro meses a gente passou a receber muita gente procurando esses precatórios de alto valor para poder fazer operações de compensação tributária, e o valor deles subiu. Não mudou muito, mas melhorou”, afirma Costa.
“Em um precatório que era para ter sido pago neste ano, mas vai ser pago no ano que vem, o desconto é de 20%. É muito difícil alguém que vai usar para compensação estar disposto a pagar esse desconto. Fica mais para quem quer investir.”
Com informações Folha de S Paulo